O poder do autovalor
Alessandra Miranda Soares
Imagine um mundo onde a capacidade de uma pessoa não é definida pela carreira de sucesso, mas pela dedicação incansável ao bem-estar do/a outro/a. Este é o mundo de vocês, mães de pessoas com deficiência (PcD). Mulheres que, todos os dias, enfrentam desafios com uma força silenciosa que lhes passa despercebida. Sua jornada é dedicação aos filhos/as é ofuscada pela carga de trabalho avassaladora e pelo desconhecimento de sua força interior.
Seu cotidiano é recheado com responsabilidades e trabalho que dura 24 horas/sete dias. De prescrições médicas a dar conta de burocrácia e da defesa dos direitos ao apoio emocional e físico de seu/sua filho/a, seu trabalho intenso se estende muito além da compreensão tradicional de “maternidade”. É um trabalho em tempo integral, não remunerado e ingrato, que exige reservas de energia, paciência e criatividade que esgotariam a maioria das pessoas. Não há dias de licença médica, férias remuneradas pouco ou nenhum descanso, ciclo interminável de cuidados as esgota... podendo leva-las a doenças graves, incluindo fadiga crônica, ansiedade, depressão e burnout.
O cuidado constante do outro/a faz com que vocês desenvolvam capacidades extraordinárias, cujo poder desconhecem. Vocês se tornam mestras na resolução de problemas, defensoras tenazes, terapeutas habilidosas e organizadoras meticulosas com uma profunda reserva de amor incondicional. Aprendem a adaptar-se a situações imprevisíveis, celebram vitórias microscópicas e encontram alegria nos pequenos progressos de seus/suas filhos/as. Apesar disso, sua força interior e conjunto de habilidades são negligenciados pela sua familia, sociedade e, especialmente, por vocês mesmas.
Minha tese de doutorado intitulada Experiências das mulheres mães de pessoas com deficiência: da (in)visibilidade à participação, defendida em 2018, mostra que há uma necessidade crítica de estudos que documentem sistematicamente os pontos fortes, os mecanismos de enfrentamento das demandas e as competências adquiridas por mães de PcD. Esta produção científica é fundamental para a compreensão do que significa ser mãe de filhos/as com deficiência, a criação de políticas públicas de apoio à elas e, principalmente, para a promoção de mudança de atitude frente à sua realidade.
Por isso mãe, reconheça o poder de seu alto valor. Celebre suas realizações diárias para fortalecer sua autoestima. Construa uma rede de apoio, identifique pessoas e serviços que podem auxiliá-la nas atividades regulares. Procure buscar formas de aliviar sua sobrecarga, compartilhando responsabilidades. Cuide-se mais, assuma seus limites e tente investir em bem-estar físico e emocional. Reservar tempo para si mesma, leia algo, dance em casa, caminhe com a vizinha ou brinque com seus filhos/as. Seja gentil consigo mesma, não se culpe e não se considere incapaz se algo não der certo, você sabe que fez o que pode. Não se isole, o isolamento é um risco para sua saúde mental. Conecte-se com outras mães de filhos/as com deficiência, compartilhem suas histórias, aprendam juntas e, acima de tudo, se apoiem.
Adotar essas práticas não eliminam a sobrecarga ou os desafios, mas ajudam a reconhecer e compreender seu valor e suas competências assim como a cultivar uma vida mais saudável porque cuidar de si é parte fundamental para cuidar do outro.
Profa. Dra. Alessandra Miranda Mendes Soares. Ufersa-RN. Especialista em Empoderamento de Mães de Pessoas com Deficiência.
alessandrasoares@ufersa.edu.br
