Inteligência artificial na terapia?
Silvia Lá Mon
Temos assistido ao incrível avanço da inteligência artificial (IA) em diversos segmentos da sociedade. Em alguns casos, o seu uso aponta para um progresso e aperfeiçoamento nas tarefas cotidianas, de criação de imagens e na ciência como um todo, porém o mau uso pode causar muitos danos e prejuízos nessa mesma sociedade.
Sabemos que a IA que utilizamos em nossos computadores pessoais, celulares e aplicativos nada mais é do que uma grande “central de nuvem” que reúne todas as informações já descritas em todos os possíveis assuntos que conhecemos.
Recentemente fiquei chocada quando, ao conversar sobre esse assunto com um colega psicólogo, ele me relatou que já foi constatado mais de um caso de suicídio de jovens que se “aconselhavam emocionalmente” com um programa de IA. Então comecei a imaginar que esses jovens provavelmente já estavam mergulhados num estado de depressão (não detectado pela família) e que, como a maioria deles, ficavam isolados em seus quartos, sem amigos reais, sem diálogo familiar, até que de alguma forma teve início uma interação com uma IA, sobre questões que os incomodavam.
Os robôs não possuem nem emitem juízo de valor, somente respondem às perguntas feitas — e é ai que mora o perigo. De qualquer forma, a culpa não é da tecnologia, mas do mau uso que fazemos dela. Por isso é tão importante que os pais interajam com seus filhos, observem seu comportamento, olhem nos seus olhos e, se necessário, orientem ou peçam ajuda profissional.
Carl G. Jung, contemporâneo de Freud, tem uma frase bastante famosa que diz: “Conheça todas as teorias, domine todas as técnicas, mas, ao tocar uma alma humana, seja apenas outra alma humana”. Nenhuma frase define melhor o trabalho do psicólogo ou terapeuta, e é nesse exato ponto que nenhuma IA poderá substituir um profissional e nem mesmo um amigo. Cito também esta última figura pois muitas pessoas com conflitos de relacionamento preferem interagir com computadores do que fazer amigos. O icônico filme Blade Runner nos mostra uma realidade futura onde as pessoas interagem com robôs (denominados no filme como replicantes) como colegas de trabalho, amigos e até como parceiros afetivos.
É realmente temeroso que isso venha a acontecer, mas temos visto que a indústria de robôs tem se tornado cada vez mais sofisticada, enquanto que o ser humano tem se tornado cada vez mais acomodado e dependente. Nas escolas, já estamos vivendo uma realidade em que a lousa do professor é digital e o caderno dos alunos são os notebooks. Muitas vezes, quando pedimos uma redação escrita à mão, somos incapazes de entender a caligrafia do aluno, porque não praticam mais a escrita cursiva, só digitam no notebook e no celular. Temos até verbos novos em nossa linguagem, como deletar, teclar etc.
Digo isso porque temo que num futuro próximo as crianças deixem de escrever à mão, e isso pode ser desastroso. Sabem por quê? Porque a escrita assim como diversas atividades manuais exigem conexões e sinapses cerebrais altamente complexas e sofisticadas. Então, vamos pensar: se o cérebro deixar de fazer essas conexões, o ser humano vai emburrecer cada vez mais, enquanto as IAs vão se tornando cada vez mais inteligentes.
O que podemos esperar? Deixo para cada um de vocês essa reflexão.
Silvia Lá Mon é psicóloga
