Por que serenidade não se força?
Andrés De Nuccio
Há um ponto em que percebemos que tentar ficar calmos só nos deixa mais tensos. É um paradoxo conhecido por todos: quanto mais buscamos a paz, mais a mente parece fugir dela... Isso não acontece por falta de vontade. A razão é simples: o cérebro não responde bem à pressão. E, ainda assim, é exatamente por pressão que tentamos nos transformar.
Grande parte dos conselhos populares — “respira fundo, não pensa nisso, foca no positivo” — funciona por alguns minutos, mas não sustenta mudanças reais. Não se trata de fraqueza pessoal, como a neurociência explica hoje: o cérebro humano possui sistemas automáticos que operam muito mais rápido do que nossa boa vontade consciente, isto é, emoções, hábitos mentais e reações surgem antes mesmo de termos tempo de “fazer algo a respeito”. Por isso, tentar controlar a mente pela força costuma gerar o efeito oposto: criamos ainda mais tensão.
Ao longo de décadas ensinando ioga, meditação e psicologia aplicada, aprendi que a transformação emocional não acontece por atos heroicos, mas por pequenos ajustes feitos com constância. É assim que o cérebro muda: pela repetição frequente, estável e suave. Neurônios que disparam juntos conectam-se. E, quando redirecionamos o olhar interno, pouco a pouco, dia após dia, criamos novas vias para a calma, clareza e presença.
Com o tempo, percebi algo que mudou minha forma de ensinar. Os/as alunos/as saíam das aulas do Instituto Ísvara maravilhosamente bem: leves, presentes, respirando de outro jeito. Contudo, algumas vezes me diziam: “Andrés, quando chego em casa tudo volta ao que era antes!”. O bem-estar alcançado no tapetinho de ioga ou na meditação não acompanhava a vida real. Comecei a questionar: se o treino não ajuda nos momentos difíceis (na conversa tensa, no dia cheio e mente agitada), então o conhecimento está incompleto. Comecei a buscar uma forma de levar a sabedoria da aula para dentro da rotina, para o caos, para onde ela realmente faz diferença.
Foi assim que, pouco a pouco, nasceu a Confraria da Mente, espaço onde o que aprendemos no silêncio também funciona quando a vida faz barulho; onde a prática não depende de tempo livre, inspiração ou força de vontade, mas de pequenos gestos internos que se repetem até virarem um novo modo de existir. Quando falo em serenidade, não falo de calmaria artificial nem daquele sossego que dura só até aparecer a próxima contrariedade. Falo de uma força silenciosa que se manifesta na capacidade de responder em vez de reagir, de respirar antes de se afogar, de enxergar antes de se perder. Uma serenidade que não anula as emoções, mas impede que elas nos arrastem. Uma lucidez que deixa a mente menos barulhenta por dentro, mesmo quando o mundo está barulhento por fora. E o mais surpreendente é que isso nasce de uma reeducação interna leve, contínua e poderosa, não do esforço.
Se essa visão ressoou em você, não é por acaso. Quem lê o JORNALZEN costuma ter esse olhar atento para dentro, essa vontade de caminhar com mais presença e inteireza. É uma alegria ver que existe uma comunidade inteira que aprecia silêncio, profundidade e lucidez num mundo tão barulhento. Para quem sente que quer aprofundar esse movimento, indico o Percurso Cognitivo sobre a Independência Emocional. Gratuito e online, é um caminho que reúne pessoas que buscam exatamente esse tipo de clareza interior. Se quiser participar, as portas estão abertas.
Andrés De Nuccio é psicólogo e professor de meditação
